Recentemente assisti ao filme Caminho da liberdade (The Way Back,
2010), com Jim Sturgess, Colin Farrell, Ed Harris, dentre outros. O filme
relata a odisseia de um grupo de prisioneiros de um Gulag na Sibéria que, em
1941, andaram mais de 6.500 quilômetros, passando pelo deserto de Gobi
(Mongólia), Tibete e Himalaia, até chegar à Índia, no inverno de 1942. Embora
no início do filme conste o aviso de que o mesmo é baseado em uma história
real, fiquei intrigado e comecei a pesquisar sobre o livro que inspirou o
filme.
O livro em questão é ‘’The Long Walk (1955) de Slawomir Rawicz, um
polonês feito prisioneiro pelos soviéticos em 1941. Ao pesquisar no
google, li que em 2006, a BBC publicou
um relatório baseado em antigos arquivos soviéticos, incluindo textos que
teriam sido escritos pelo próprio Rawicz, mostrando que ele próprio teria sido
libertado, em 1942, como parte de um acordo de anistia entre soviéticos e
poloneses e em seguida teria sido transportado pelo Mar Cáspio até um campo de
refugiados no Irã e, portanto, a fuga até a Índia nunca teria acontecido.
Em maio de 2009, Witold Glinski, um veterano de guerra polonês
vivendo no Reino Unido, apareceu dizendo que a história de Rawicz era verdade,
só que, de fato, teria acontecido com Glinsk ao invés de Rawicz.
Enquanto se discute a paternidade de que realmente realizou o
grande feito, acabei me deparando com uma estória parecida e que conta a incrível saga de sobrevivência de
um herói de guerra polonês durante a II Guerra Mundial e que morreu aos 91
anos, em fevereiro de 2013.
O Tenente Czeslaw 'Tony'
Rogers enfrentou uma viagem de 1.350 quilômetros a
pé, através dos desertos gelados da
União Soviética até à Índia
depois de ser libertado de um gulag. Depois, andaria ainda mais, de trem
e por outros meios, até chegar à Grã-Bretanha.
Posteriormente,
ele seria um piloto condecorado da RAF, pilotando Spitfires e
bombardeiros Lancasters, voando
em missões ousadas contra alvos na Alemanha.
Tenente Rogers, que adotou o sobrenome Inglês de seus heróis do
cinema Roy e Ginger, entrou na guerra em 1939, quando
seu país natal se tornou um alvo para a opressão após o pacto de não agressão entre Hitler e Stalin, que terminaria na
invasão alemã.
Quando a Luftwaffe dizimou a frota
aérea polonesa, pilotos como Rogers receberam metralhadoras e foram
convocados para lutar, em solo, contra as
forças alemãs que invadiram o país pelo oeste, enquanto os
russos avançavam pelo leste. Roger terminaria sendo feito prisioneiro pelos russos e enviado para um gulag na Sibéria, condenado a 25 anos de
prisão.
O traslado para o
gulag foi feito em um caminhão de gado, em uma viagem que levou três dias. Havia mulheres e crianças nos caminhões e sempre que uma criança morria no trajeto, seu corpo era simplesmente jogado na neve.
Após a invasão da
Rússia por Hitler em 1941,
Stalin aliou-se à Grã-Bretanha e aos EUA contra os alemães. O primeiro-ministro britânico Winston Churchill pediu a
libertação de cidadãos polacos da
Sibéria – e Rogers foi um deles. Os guardas abriram os portões do gulag e
disseram para os prsioneiros saírem. No início, eles pensaram
que era alguma ‘’pegadinha’’ e quem saisse seria abatido a tiro.
Mas eles partiram em grupos de dez, em trenós feitos especialmente
para as condições climáticas adversas. No grupo de Tony
só ele e outro aviador
sobreviveram, os outros pereceram
na neve.
Tony e seu companheiro caminharam 830 milhas a
pé, antes que pudessem entrar clandestinamente em um trem indo para o sul, onde chegariam na Índia,
de onde ele conseguiu passagem para a
Grã-Bretanha.
Vale destacar que um
grande número de pilotos poloneses, após a invasão da Polônia, iria para o
Reino Unido e França, continuar a luta contra os alemães. Em
junho de 1940, o governo polonês no exílio formou uma Força Aérea polonesa no Reino Unido, com
dois esquadrões de caça - 302 e 303 - compostas por pilotos poloneses e pessoal
de terra, com comandantes britânicos. A maioria dos pilotos poloneses possuia centenas
de horas de experiência de vôo pré-guerra e estava entre os mais experientes na
batalha. Eles haviam aprendido com a experiência de combate bem de perto.
Uma vez na Inglaterra, com
o seu novo nome adaptado ao idioma local, Rogers conheceu Nan,
uma motorista da WAF, que se tornaria sua
esposa e mãe de seus dois filhos.
Durante o resto da guerra, ele voou
em Spitfires da RAF antes de ser convocado
para o Comando de Bombardeiros para
pilotar o Lancaster por causa de
sua experiência na Polônia
em voar em aeronaves do tipo bimotor. Ele se juntou ao 138º Esquadrão de Operações Especiais (Moonlight Squadron),
baseado em Cambridgeshire.
Em 1944, ele voou em uma
missão de abastecimento em
Varsóvia - em um Halifax
ou Stirling -
voando baixo para jogar suprimentos em para-quedas, incluindo armas, explosivos e aparelhos de rádio em um locais estratégicos, onde as luzes piscavam para indicar a
localização exata. Caças alemães estavam à espera dos
aviões subirem,
mas eles mantiveram o voo baixo , porém muitas equipes foram perdidas e as missões foram interrompidas depois de se revelarem muito arriscadas.
Os pilotos poloneses alegam terem abatido 201 aviões. Somente o 303º Esquadrão, em que o brigadeiro Tadeusz Sawicz serviu, foi o responsável pelo maior número
de mortes - 126 – entre todos os esquadrões aliados na Batalha da Grã-Bretanha.
O Polish War Memorial, situado nos arredadores da sede da
RAF, em Northolt, foi inaugurado em 1948 como um tributo à
contribuição polonesa junto aos aliados.
Rogers continuou a servir no Comando de Bombardeiros voando em Lancasters até 1948, quando passou para
a reserva. Estão registrados no
seu assentamento funcional, 12.000 horas de voo em uma variedade de tipos de
aeronaves, dentre elas os já citados Spitfires e Lancasters, além de
Wellingtons e jatos Meteoro, após o fim da guerra.
Rogers seria agraciado com importantes comendas e a maior das condecorações polonesas, a Virtuti
Militari. Além das medalhas, Rogers
era sempre convidado de honra em jantares comemorativos da Batalha da
Grã-Bretanha, onde sentava na mesa principal com o comandante.
No início de 1950, Rogers e sua
família foram para Cingapura,
onde ele assumiria o posto de piloto pessoal
do General Sir Gerald
Templer, Alto Comissário britânico
na Malásia durante a insurgência comunista. Uma de suas
atividades no novo posto era a de voar em aeronaves leves, tais como o Auster,
para detectar atividades dos guerrilheiros na selva malaia, dando cobertura às
tropas terrestres no combate.
Rogers acabou sofrendo um
acidente vascular cerebral em que acabou perdendo os movimentos, sendo ajudado
pelo Fundo
Benevolente da RAF que o presenteou com uma cadeira de rodas elétrica. Rogers terminaria sendo um
grande doador deste fundo visando ajudar os velhos companheiros de RAF.
Rogers faleceu em 15 de
janeiro de 2013 na Hyperion Nursing Home em
Fairford, Gloucestershire.
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