sábado, 16 de abril de 2016

O Muro

O Brasil hoje vive dias agitados por conta da grave crise política e econômica. Estamos na véspera da votação de uma autorização para um segundo processo de Impeachment em 24 anos. Como se não bastasse ter aprendido as lições do processo de 1992, o acirramento dos ânimos deixaram as redes sociais e já se reflete nas ruas. 

Em Brasília, por exemplo, foi erguida uma barreira para separar os manifestantes a favor do impeachment e os contra. Pois bem, a mesma já foi apelidada de ‘’Muro de Brasília’’, numa referência explícita ao famigerado Muro de Berlim, símbolo da ‘’Guerra Fria’’ do pós II Guerra Mundial.

Voltando um pouco na história, após a queda do III Reich, a Alemanha foi dividida pelas potências vencedoras em quatro setores: a parte oeste ficou sob o domínio da França, Inglaterra e Estados Unidos; a parte leste ficou a cargo da então União Soviética.
Embora estivesse no território controlado pelos soviéticos, Berlim, devido ao fato de ser a capital alemã e  à sua posição estratégica (no coração da Alemanha Oriental) também seria repartida entre os vencedores da II Guerra, tendo ficado com a URSS a maior parte.

Em 1949, a Alemanha foi dividida em duas: a República Democrática Alemã (RDA ou DDR) sob influência soviética (na parte oriental) e a República Federal da Alemanha (RFA ou GBD) na parte ocidental. A Alemanha Ocidental possuía um território bem maior do que a Alemanha Oriental.

Na década de 1950, o Plano Marshall injetou milhares de dólares na reconstrução da Europa Ocidental.  Evidentemente os efeitos dessa ação foram sentidos na economia. A Alemanha Ocidental se desenvolvia ao passo que a Oriental se fechava cada vez mais. Não demorou muito para que a debandada do leste para o oeste começasse. Moscou precisava agir.

Na madrugada de 13 de agosto de 1961, um domingo, guardas da RDA começaram a colocar arame farpado em frente ao portão de Brandenburgo, símbolo de Berlim. O serviço de rádio da parte leste interrompe a programação para anunciar o bloqueio ao redor da parte oeste. No dia seguinte, 12 berlinenses ocidentais que trabalhavam no leste e 53 mil orientais que faziam o caminho inverso não chegaram ao trabalho.

No dia 15 de agosto Conrad Schumman um guarda da Alemanha Oriental protagonizou uma das mais famosas fugas registradas. A sua foto correu o mundo e tornou-se um símbolo desse período. Ao pular a cerca de arame farpado, ele acenou com a arma e desapareceu numa van da polícia ocidental.



Com o passar do tempo, as fugas de civis e militares evidenciaram que era preciso construir um muro, o que aconteceria ainda em agosto. O muro de Berlim concretizou a profecia de Winston Churchill que dizia que uma cortina de ferro separava a Europa. A polarização entre EUA X URSS atingia o seu ápice. Milhares de pessoas morreram ao tentarem passar pelo muro. O número é incerto, dados da RDA apontam 80, mas sabe-se que devem ter sido muito mais. 

Foram necessários vinte e oito anos para que o muro fosse derrubado. Na noite do dia 09 de novembro de 1989,  com o Leste Europeu já em processo de libertação do jugo soviético cujo regime entrava em colapso, o acesso aos lado ocidental foi liberado. Ao chegarem do outro lado foram recebidos com abraços e alguns bares ofereceram cerveja de graça aos vizinhos.


A Alemanha se reunificaria em outubro de 1990. 

Ps: Vale a pena dar uma olhada nesse site:

http://super.abril.com.br/multimidia/muro-berlim/muro-de-berlim-ah-76.swf

sábado, 30 de janeiro de 2016

Besouros no Telhado



Há exatos 47 anos, os Beatles faziam o seu último show. De lá para cá, o seu legado continua mais do que vivo e a sua música continua a encantar uma nova geração de fãs.

Era o horário de almoço de um dia frio no centro de Londres. Do terraço da sede da Apple Corps, empresa do grupo, situada no número 3 da Savile Row, ouviam-se os primeiros acordes. Era o início do show surpresa que agitaria as cercanias.

Antes de ser abruptamente interrompida pela polícia, que se opusera ao ruído e à perturbação da ordem, a banda (acompanhada do jovem tecladista Billy Preston) conseguiu emocionar os londrinos em telhados adjacentes e ruas abaixo com uma sequência de canções que haviam sido ensaiadas para um possível futuro álbum (que eventualmente nunca seria lançado).

O set de nove canções incluía Do not Let Me Down, I’ve Got a Feeling e Get Back - todos considerados clássicos nos anos subsequentes.

George Harrison relataria a experiência em Anthology:  

 ‘’Nós fomos no telhado, a fim de viabilizar a idéia do concerto ao vivo, porque ele era muito mais simples do que ir em qualquer outro lugar; também nunca ninguém tinha feito isso, por isso seria interessante ver o que aconteceria quando começássemos a tocar lá em cima. Foi um estudo social pouco agradável.

Montamos uma câmera na área de recepção da Apple, atrás de uma janela para que ninguém pudesse vê-la, e nós filmamos as pessoas entrando. A polícia e todo mundo entrou dizendo: 'Vocês não podem fazer isso! Você tem que parar. "

O concerto no telhado foi o primeiro show ao vivo desde que a banda parou de excursionar em 1965 (cansados dos constantes gritos das meninas e frustrados por não serem capazes de reproduzir os arranjos mais complexos de seus álbuns de estúdio, diante da falta de tecnologia adequada) e era para ser o último da banda.

Os Beatles viviam tempos difíceis devido ao fato do desgaste da convivência e os diferentes rumos que cada membro queria tomar. Os esforços para trazer o amor de volta, como um novo filme ou mesmo a gravação de um novo álbum só tornou as coisas ainda piores.

Para suportar o frio e o vento cortante que soprava no terraço, John Lennon pegou emprestado um casaco de pele de Yoko Ono e Ringo Starr um casaco da esposa, Maureen Starkey.

O show de 42 minutos foi gravado em duas mesas de 08 canais, no porão da Apple, por George Martin, o engenheiro Glyn Johns e pelo operador Alan Parsons. Um canal, cada,  com os vocais de Paul, George e John, um para o teclado de Preston, um para o baixo de Paul, um para a guitarra de Lennon, um para a equipe de filmagem, um para a bateria e outro para a guitarra de Harrison.

Segundo Parsons, ‘’foi um dos dias mais excitantes e memoráveis de minha vida. Ver os Beatles tocando juntos de novo e interagindo com as pessoas em volta, com 5 câmeras no telhado, câmeras nas ruas, foi realmente inacreditável’’.

Eis, então, o setlist daquele dia histórico:
Get Back (5 takes)
I Want You (She’s so heavy)
Don’t Let Me Down (2 takes)
I’ve Got a Feeling
One After 909
Danny Boy
Dig a Pony (2 takes)
God Save The Queen
A Pretty Girl is like a Melody

Vale ressaltar que as versóes de I Want You (She’s so heavy), God Save The Queen (performada por Preston, enquanto Alan Parsons mudava os rolos de fitas) e A Pretty Girl is like melody foram tocadas parcialmente entre os takes de filmagem, bem como Danny Boy. Fluiram como brincadeiras que as bandas fazem quando estão ensaiando.

Como já foi dito, o show começou por volta do meio-dia, coincidindo com a hora de almoço de muitos que trabalhavam em escritórios nas proximidades. Rapidamente uma multidão se formou, embora poucas pessoas pudessem vê-los, para ouvir os Beatles tocarem.


O trânsito na Saville Row e ruas vizinhas engarrafou, até que a polícia de uma delegacia nas proximidades (Central West End), entrou no prédio e ordenou que o grupo parasse de tocar.

Quando a polícia invadiu o prédio, Paul brincando, improvisou a letra de Get Back: '' Você está brincando no telhado de novo e sabe que sua mãe não gosta, ela vai mandar te prender''. Em seguida, o show terminou e Lennon emendou: ''Quero agradecer em nome do grupo e de nós todos e espero que tenhamos passado no teste''. Nada melhor do que ''subir no telhado'' para dizer que o sonho tinha acabado.


quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Challenger: 30 anos depois


Em 28 de Janeiro de 1986, o ônibus espacial americano Challenger explodiu 73 segundos após a decolagem, trazendo um fim devastador para 10 missão da espaçonave. O desastre causou a morte de todos os sete astronautas a bordo, incluindo Christa McAuliffe, uma professora de New Hampshire que tinha sido selecionada para participar da missão e ensinar lições de espaço para crianças em idade escolar em todo o país. Posteriormente, a investigação confirmou que um dos O-rings (Anéis-O) de borracha, que haviam sido projetados para separar as seções do foguete, tinha falhado devido a temperaturas frias na manhã do dia do lançamento. A tragédia e suas consequências recebeu extensa cobertura da mídia e levou a NASA a suspender temporariamente todas as missões dos ônibus espaciais.

Dez anos antes, a NASA apresentava ao mundo a primeira nave espacial tripulada reutilizável do mundo, o ônibus espacial (Space Shuttle). Em 1981 aconteceu o primeiro voo com a Columbia, em uma missão de 54 horas no espaço. Lançada por dois propulsores sólido de foguete e um tanque externo, a Columbia orbitou em torno da Terra. Ao retornar, ejetou os motores para reduzir a velocidade, planando até pousar em segurança.As primeiras missões dos ônibus espaciais serviram para levar equipamentos de satélite ao espaço e realizar experimentos científicos.

A Challenger foi o segundo ônibus espacial da NASA a entrar em serviço. A sua viagem inaugural foi realizada em 4 de Abril de 1983 e foram feitas um total de nove viagens antes de 1986. Naquele ano, ele foi programado para ser lançado em 22 de janeiro carregando uma tripulação de sete membros, incluindo Christa McAuliffe, 37 anos, uma professora de Estudos Sociais do ensino médio de New Hampshire que tinha ganhado um lugar na missão através do Programa Teacher in Space (Professor no espaço) da agência aeroespacial americana. Depois de passar por meses de treinamento, ela estava prestes a se tornar a primeira cidadã americana comum a viajar no espaço.

A tripulação contava ainda com o engenheiro aeroespacial Ellison Onizuka, o piloto Mike Smith, o piloto de tester e engenheiro aeroespacial Dick Scobee, o especialista em carga útil Greg Jarvis, o físico Ron McNair e a engenheira elétrica e especialista em telemetria Judith Resnik.

O lançamento do que seria a décima missão da Challenger, no Centro Espacial Kennedy em Cabo Canaveral, Florida, foi adiado por seis dias devido ao mau tempo e problemas técnicos. A t A manhã de 28 de janeiro foi excepcionalmente fria, e os engenheiros alertaram seus superiores que certos componentes, especialmente os Anéis-O de borracha que selaram as junções de foguetes sólidos estavam vulneráveis a falhas em baixas temperaturas. No entanto, esses avisos foram ignorados, e às 11:39 a Challenger decolou.



Setenta e três segundos mais tarde, com centenas de espectadores em solo, incluindo as famílias dos astronautas, a nave explodia deixando um rastro de fumaça parecida com um escorpião. Milhões de pessoas assistiram a tragédia ao vivo na televisão. A explosão matou instantaneamente os sete tripulantes, os destroços se espalharam pelo oceano, onze anos depois algumas peças foram recolhidas em praias da Flórida. Além disso, a tragédia chocou a  nação e colocou em cheque o  programa de ônibus espaciais da NASA.

Logo após o desastre, o presidente Ronald Reagan nomeou uma comissão especial para determinar as causas do acidente e desenvolver futuras medidas corretivas. Liderada pelo ex-secretário de Estado William Rogers, a Comissão incluia ainda o ex-astronauta Neil Armstrong e ex-piloto de testes Chuck Yeager. Sua investigação revelou que a falha do O-ring causou uma quebra do selamento do foguete, permitindo que o gás quente sob pressão de dentro do motor do foguete sólido alcançasse a parte externa e invadisse o anexo das ferragens adjacentes do SRB e do tanque de combustível externo, levando à separação do anexo do lado direito do SRB e a falha estrutural do tanque externo. Forças aerodinâmicas rapidamente destruíram a nave por completo.

A comissão também descobriu que a Morton Thiokol, aempresa que projetou os foguetes de combustível sólido, tinham ignorado as advertências sobre potenciais problemas. Gerentes da NASA estavam cientes desses problemas de design, mas também não tomaram as medidas necessárias. O cientista Richard Feynman, membro da comissão, ficou famoso ao demonstrar a falha do O-ring ao público através de um simples copo de água gelada.



Após o acidente, a Nasa suspendeu o as viagens dos astronautas ao espaço por mais de dois anos, uma vez que redesenhou uma série de características dos ônibus. Os voos somente retornariam em setembro de 1988, com o sucesso do lançamento da Discovery. Desde então, o ônibus espacial levou a cabo numerosas missões importantes, incluindo a reparação e manutenção do telescópio espacial Hubble e da construção da Estação Espacial Internacional. Em 1 de fevereiro de 2003, um segundo desastre do ônibus espacial abalou os Estados Unidos quando Columbia desintegrou-se após a reentrada na atmosfera, matando todos a bordo. As missões seriam retomadas em julho de 2005, e os ônibus espaciais foram aposentados em 2011.

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

O inferno na Terra


Sunao Tsuboi tinha 20 anos de idade e era um estudante universitário quando conheceu o verdadeiro  "inferno na terra". As cicatrizes no rosto lhe acompanham já fazem sete décadas . As mãos frágeis ajudam a vasculhar as fotos em preto e branco. Em uma é possível vê-lo com a cabeça raspada em meio a vários sobreviventes. 

"Sou eu", diz ele. "Nós estávamos esperando encontrar algum tipo de ajuda médica, mas não havia nenhum tratamento disponível, e nenhuma comida ou água. Eu pensei que tinha chegado ao fim. " 

A foto foi tirada sobre a ponte  Miyuki,  Hiroshima, três horas após o Enola Gay, um bombardeiro B-29, ter lançado uma bomba nuclear de 15 quilotons sobre a cidade na manhã de 6 de agosto de 1945. Entre 60.000 e 80.000 pessoas foram mortas instantaneamente; nos meses que se seguiram,  o número de mortos subiu para 140.000.

O Japão, Tsuboi e dezenas de milhares de outros hibakusha (termo que designa os sobreviventes da bomba atômica) comemoraram no último mês o 70º aniversário do primeiro ataque nuclear da história.

"Pessoas como eu estão perdendo a força para falar sobre as suas experiências e continuar a campanha contra as armas nucleares", disse Tsuboi, um diretor de escola aposentado que tem viajado o mundo para alertar sobre os horrores da guerra nuclear. 

A idade média dos mais de 183.000 sobreviventes registrados dos ataques de Hiroshima e Nagasaki subiu um pouco acima de 80 pela primeira vez no mês passado.

Embora cada hibakusha tenha uma lembrança única da manhã daquele 6 de agosto e suas conseqüências, eles ainda testemunham, em suas palestras,  um sentimento de descrença por muitas pessoas sobre o tamanho da escala de destruição vivenciada.

Tsuboi  se lembra de que na hora que a bomba foi lançada ele iria pediar a mão da noiva, Reiko, em casamento. Ele recorda de ouvir um estrondo alto e, em seguida, voar e ser jogado a 10 metros de distância. Quando recuperou a consciência, descobriu que  tinha sido queimado em grande parte de seu corpo. As mangas de camisa e as calças simplesmente foram ‘’roubadas’’ pela força da explosão. A noiva simplesmente foi desintegrada pela explosão.

"Meus braços estavam muito queimados e parecia que algo escorria por entre meus dedos", disse Tsuboi, que é co-presidente da Nihon Hidankyo, uma organização nacional que reúne vítimas de bombas atômicas e de hidrogênio. 

 "Eu não tinha idéia do que tinha acontecido. Eu achava que fora uma grande bomba convencional. Eu não tinha idéia que era uma bomba nuclear e que eu tinha sido exposto à radiação. Havia tanta fumaça no ar que você mal podia ver 100 metros à frente, mas o que eu vi me convenceu de que eu tinha entrado em um inferno na terra''.

''Havia pessoas chorando, pedindo  ajuda, chamando por familiares. Eu vi um estudante com o olho pendurado. As pessoas pareciam fantasmas, sangravam muito e tentando andar antes de desmaiar. Alguns tinham membros perdidos''.

"Havia corpos carbonizados por toda parte, inclusive no rio. Olhei para baixo e vi um homem segurando um buraco em seu estômago, com as vísceras expostas. O cheiro de carne queimada era insuportável. "

 Ele foi levado para um hospital, onde permaneceu inconsciente durante mais de um mês. Quando acordou não tinha idéia de que a guerra havia terminado e que o Japão estava sob ocupação americana. ‘’Foi difícil assimilar’, conta.

Desde então Tsuboi foi hospitalizado 11 vezes, incluindo três ocasiões em que médicos disseram que ele estava prestes a morrer. Após dois diagnósticos de câncer, ele toma medicamentos para várias doenças, resultantes da exposição à radiação.

Os sobreviventes ainda seriam vítimas do preconceito e do estigma. Arrumar emprego, por exemplo,  era muito mais difícil pois as empresas davam preferências a pessoas que não tinham sido vítimas das bombas. 

Em Nagasaki, a segunda cidade vítima da bomba atômica, até hoje os sobreviventes são monitorados. É sabido que a radiação impactou na saúde dos
hibakusha, porém é praticamente impossível saber o quanto cada um foi realmente afetado.

Por isso a importância de mostrar os horrores das armas nucleares para as novas gerações.

  
Os depoimentos dos sobreviventes da bomba atômica são agora uma questão de registro histórico. Os hibakusha estão tentando assegurar que suas experiências não morram com eles, num momento em que o mundo está enfrentando ameaças nucleares da Coreia do Norte e Rússia.